A Escalada do Montanhismo

Matéria publicada originalmente na coluna Viver para a Montanha, na edição número 4 do Jornal da Montanha.
Por Daniel J. Casas.   




    O montanhismo nacional está passando por uma grande fase de desenvolvimento em todas as suas vertentes. É perceptível o crescente número de praticantes, ofertas de serviços e produtos para o esporte, assim como, atletas experientes atingindo níveis altíssimos de rendimento e expressiva organização em associações, clubes e federações.

       O aumento da popularização do esporte é significativo. Observa-se isso nos meios de comunicação, onde cada vez mais o montanhismo pode ser visto em mídias acessíveis como a TV e internet. Esse fato faz com que o esporte seja mais conhecido e consequentemente aumenta o número de praticantes que pode ser notado nas montanhas, falésias, academias e escolas de escalada.     

A popularização gera o aumento da demanda por produtos e serviços especializados, fazendo com que cresça o número de lojas, academias, escolas e novas marcas de fabricação nacional. Para esses setores o crescimento do esporte também é positivo, aumentando a oferta e formando um ciclo ascendente de desenvolvimento.

       Juntamente com esse desenvolvimento, muitos praticantes têm a oportunidade de se profissionalizarem como atletas, instrutores e guias. Dessa maneira o montanhismo consegue atingir novos níveis de rendimento, os quais eram difíceis de imaginar no passado. Novas conquistas, expedições, melhores resultados em competições, aumento do grau de dificuldade são exemplos desse progresso.

       Outra consequência dessa popularização é a necessidade de organização, que desde o começo foi feito em clubes e associações, mas que por si só não foi possível suprir a necessidade dessa demanda, fazendo com que surgissem as Federações estaduais e a Confederação Brasileira de Montanhismo e Escalada. Essa organização é de vital importância para o crescimento sustentável do montanhismo.

       Para que o progresso seja positivo, surge uma peça chave nesse processo, o Guia de Montanha, ao qual compete a condução de pessoas no ambiente natural assim como, a transmissão de todo o conhecimento do montanhismo desde as técnicas básicas de segurança aos princípios e condutas éticas que norteiam o esporte. Como um Mestre está para a educação o Guia de Montanha está para o montanhismo. Vendo por esse prisma, o mesmo deve ser altamente qualificado e competente para a execução dessa função primordial do desenvolvimento sustentável e ordenado do esporte.

       O conhecimento deve ser passado de forma completa e sistemática aos que desejam se aventurar no agreste. Cursos de iniciação ao montanhismo e escalada devem possuir uma qualidade excepcional, a fim de introduzir com segurança o iniciante à montanha. Esse ensinamento deve seguir por gerações, fazendo com que o esporte cresça em bases sólidas, porém deve ser sempre reciclado, revisto e aperfeiçoado, seguindo a corrente do aprimoramento da atividade.

       O Guia de Montanha não necessariamente precisa ser um super atleta, mas deve ser um expoente no esporte. Precisa ter experiências reais bem acima da média em todas as modalidades de escalada. Possuir conhecimentos em didática, relações interpessoais, condução de grupo entre outras. Qualidades como paciência, liderança e integridade são também desejáveis a qualquer pretendente a essa função.

       A formação desse profissional acontece quase que exclusivamente na montanha ao longo do tempo, algo entre 15 e 20 anos, se praticado assiduamente. Acontece também em viagens e expedições fora do seu local habitual, onde o mesmo pode viver experiências novas, além de compartilhar conhecimentos com escaladores de outras escolas. A busca por conhecimento em literatura específica também é um grande agente nessa formação.

       Pelo fato do guia ser uma figura importante nesse processo, é gerado uma aura de supremacia, o que não é real, mas faz com que muitos desejem ocupar essa posição de destaque e usá-la como status social, fato que prejudica de forma irreparável todo o processo de aprendizagem e da propagação idônea da atividade montanhística.
      
       Apesar de esforços significativos nessa área, no Brasil ainda não há efetivamente uma organização nacional de padrões e competências para a função de Guia de Montanha, a exemplo que ocorre em outros paises. Em função disso se abre espaço a oportunistas que sem a devida experiência e competência acabam desinformando ao conduzir pessoas nas atividades de montanhismo, gerando grandes prejuízos ao esporte, impactos desnecessários no ambiente natural e colocando em risco seus clientes.

       No momento em que se encontra o montanhismo nacional, deve-se buscar a qualificação desse profissional que constitui a base de todo o desdobramento da prática segura e organizada das atividades de montanha. Para atingir esse objetivo, é necessária a criação de uma entidade representativa que estabeleça padrões nacionais de competências, qualifique, informe a população e dê suporte ao Guia de Montanha brasileiro. Dessa maneira a excelência esportiva da prática do montanhismo será definitivamente respeitada e se desenvolverá em bases sólidas, como a rocha ao qual se prolonga toda a atividade de montanha.




Daniel Juliano Casas: Praticante assíduo de montanhismo desde 1988. Guia e Instrutor de Escalada Profissional certificado pela AGUIPERJ. Faz parte do Corpo de Guias da Salamandra Escola de Montanha, sócio fundador da Associação Joinvilense de Montanhismo. Apoio: Hard Adventure, Resseg Ecologia e Aventura e Jurapê Equipamentos para Aventura.